Relato | Rui Águas



O jogo contra o Steaua de Bucareste, na Luz, é uma memória futebolística que não esqueço e, enquanto atleta, a mais importante. E ao mesmo tempo é a mais feliz e a mais inesperada porque estava em subcondição e, quando assim é, as pessoas não esperam o melhor dos desempenhos. O que é certo é que as coisas se recompuseram pelo destino, pela inspiração e também pela sorte.

No jogo da primeira mão das meias-finais, quinze dias antes, tinha sido atingido nas costas e a radiografia tinha acusado duas pequenas fracturas na zona lombar. Lembro-me que não me queriam dizer que tinham partido. Era muito importante na altura, evidentemente, e percebi depois que tinham evitado que eu soubesse o diagnóstico.

Eu não concebi a hipótese de não jogar. Estive sempre convencido de que ia jogar e preparei-me minimamente. Joguei ligado, era uma ligadura que por sinal me incomodava, que eu a certa altura tirei, e o resultado as pessoas já sabem: marquei os dois golos que nos deram a passagem à final com o PSV. Depois temos um estágio no Algarve e ainda temos um jogo com o Guimarães, no qual o Diamantino se lesiona no joelho e é a baixa principal que temos para a final.

Fui um lesionado quase crónico. Lesionava-me com alguma frequência. Na aproximação ao jogo da final tenho uma lesão muscular contra o Salgueiros, no Porto, que condicionou a minha preparação para esse jogo. E tanto condicionou que na final acabo por me lesionar outra vez, em função da preparação que não tinha podido fazer e da intensidade do jogo, física, nervosa, etc..

Dentro da felicidade que foi essa noite, houve realmente esses contratempos que tive de ultrapassar dentro do possível e depois aquele desfecho infeliz da marcação dos penalties, onde eu não estive porque tinha sido substituído. Se calhar hoje maldiziam-me a mim em vez do Veloso!

A minha pior lesão foi depois em Kiev, mas isso foi diferente: parte-se e recupera-se, é outra coisa. É uma entrada, algo que não se pode evitar, é ser apanhado numa posição mais vulnerável. Faz parte da vida do desporto e não acho que tenha sido propositado. Foi uma entrada normal que me apanhou mal. Encarei essa recuperação com muita seriedade, como sempre fazia, de resto, e as coisas acabaram por correr dentro do melhor possível. A questão muscular é que para mim sempre foi difícil de gerir.

Outra época que recordo foi quando me sagrei o melhor marcador do campeonato, em 1990/91. O Benfica foi campeão nesse ano e consegui esse título individual na última jornada. Eu era um jogador muito colectivo, era um bocadinho a antítese do finalizador. Se calhar fui dos primeiros jogadores a fazer-se notar em termos defensivos. Era um ponta-de-lança que realmente colaborava muito nessa tarefa. Por isso, a questão da marcação de golos era evidentemente importante, ainda para mais num clube grande, mas nunca fui aquele jogador que só finalizava, tinha outro tipo de características.

Daí só ter sido uma vez o melhor marcador. Ainda para mais na última jornada, nos últimos minutos do jogo, com um passe do Magnusson. Depois foi uma loucura, uma grande festa. Lembro-me de um adepto se ter atirado para cima do meu carro para me cumprimentar, para me tocar… Fui só uma vez, mas bem saborosa.

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Cabeceador exímio, característica que herdou do pai José Águas, foi 31 vezes internacional e campeão por Benfica e FC Porto. Um dos primeiros portugueses a jogar em Itália, na Reggiana.




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